Obesidade infantil - Blackbook

O relatório mundial da obesidade (World Obesity Atlas 2023)  projetou que, até 2030, o mundo passará por uma epidemia de obesidade. No Brasil, o aumento anual da obesidade infantil é de 4,4%, porcentagem de crescimento considerada muito alta. Além disso, aponta-se que cerca de 23% das crianças entre 5 e 9 anos e 18% dos adolescentes de 10 a 19 anos serão afetados pela doença em 2030.

A obesidade como epidemia não ocorre apenas em países desenvolvidos, mas também naqueles em desenvolvimento, sendo muito relacionada ao poder econômico de cada região do globo. Sendo assim, mesmo que seja um evento global, é necessário analisar separadamente cada região.

Nas Américas como um todo, por exemplo, os dados são ainda mais alarmantes que no Brasil:

Meninos 2020Meninos 2025Meninos 2030Meninos 2035
Número de meninos com obesidade (milhões)24283135
Proporção de todos os meninos na região20%24%29%33%
Meninas 2020Meninas 2025Meninas 2030Meninas 2035
Número de meninas com obesidade (milhões)18212427
Proporção de todas as meninas na região16%19%23%26%

Tabela 1.  Crianças e adolescentes (5–19 anos) nas Américas com obesidade 2020–2035.

Fonte: World Obesity Atlas 2023.

O fato de a proporção projetada de meninos e meninas de 5 a 19 anos obesos em 2030, no Brasil, ser menor quando comparada ao restante das Américas não é motivo para que a saúde brasileira não olhe para esses dados com preocupação.

A obesidade infantil não é uma novidade e, ainda assim, ano após ano as projeções tornam-se piores  no Brasil e no mundo. Sendo assim, é necessário que o profissional da saúde esteja sempre atualizado a respeito de alguns pontos como os que veremos a seguir.

As principais causas e fatores de risco

A obesidade é uma condição crônica e degenerativa caracterizada pelo acúmulo excessivo de tecido adiposo. Há alguns anos, sua prevalência aumenta em todas as faixas etárias, tornando-se um dos principais desafios de saúde pública.

É uma doença complexa que impacta significativamente aspectos sociais e psicológicos em todas as idades e grupos socioeconômicos. Ela é resultante de múltiplos fatores que ainda serão aqui analisados e incluem aspectos:

  • Metabólicos;
  • Genéticos;
  • Ambientais;
  • Comportamentais;
  • Sociais e culturais. 

O crescimento da obesidade infantil é preocupante, já que o risco  de  crianças obesas tornarem-se adultos obesos é grande – e também pelas várias consequências associadas à doença. Entre as principais causas da obesidade infantil estão as seguintes.

Má alimentação

A alimentação é um dos pilares para o desenvolvimento da condição durante os primeiros anos de vida. É importante pontuar que adultos possuem autonomia no que diz respeito à sua própria alimentação. No entanto, isso não é a realidade quando pensamos em uma criança.

É justamente na introdução alimentar que a obesidade infantil começa a ser uma realidade. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Ministério da Saúde (MS) recomendam o aleitamento materno exclusivo até os seis meses de idade, com posterior introdução alimentar diversificada, mantendo o aleitamento até os dois anos de idade.

A alimentação na rotina das famílias

A introdução alimentar deve ser feita como pontuada anteriormente, de forma diversificada. Hoje, muitas vezes, não é o que acontece, uma vez que rotinas de trabalho exaustivas junto da facilidade do acesso a alimentos industrializados acabam fazendo deles mais atrativos – em primeiro momento não para as crianças, mas para os pais.

Entre as famílias entrevistadas pelo Enani-2019, a prevalência do consumo de alimentos ultraprocessados chegou a 93% entre crianças de 24 a 59 meses e 80,5% na faixa etária de 6 a 23 meses. Já o consumo de bebidas adoçadas atinge 24,5% dos pequenos entre 6 a 23 meses, 37,7% entre 18 a 23 meses e 50,3% das crianças de 24 a 59 meses.

O problema começa a tomar proporções maiores quando a criança passa a recusar alimentos saudáveis, uma vez que seu teor de açúcar ou gorduras é menor do que o de alimentos industrializados. Por esse motivo, estes acabam sendo mais recompensadores no que diz respeito ao prazer instantâneo gerado ao se alimentar. 

Os primeiros anos de vida são o momento ideal para romper com essa realidade. Caso os pais não ofereçam alimentos industrializados ou de alto teor calórico, as crianças não terão acesso a eles. Com o tempo, voltarão a aceitar alimentos saudáveis como frutas e verduras. Na adolescência, essa intervenção é mais complexa, uma vez que as preferências alimentares já estão melhor estabelecidas e o acesso a alimentos por conta própria já é possível.

Confira mais sobre a alimentação complementar saudável após os 6 meses de idade na rotina Alimentação da criança saudável!

Sedentarismo 

Assim como o desenvolvimento de hábitos alimentares não saudáveis surgem desde a primeira infância, o sedentarismo também pode aparecer nesse momento. Recentemente, a Academia Americana de Pediatria publicou novas diretrizes para abordar a questão da obesidade infantil e nelas um fato importante é abordado.

Aponta-se uma ligação entre sedentarismo e o aumento do tempo de uso de telas como celulares, tablets e computadores como ponto-chave dessa forma de obesidade. As rotinas cansativas de pais e responsáveis colaboram para o incentivo do uso de telas em detrimento da prática de atividades físicas. Isso tende a perpetuar nessa criança até a vida adulta.

Comportamento e interação social

Apesar de a obesidade mostrar-se cada vez mais prevalente no Brasil, crianças e adolescentes obesos sofrem intenso julgamento social. Esse fator pode agravar ainda mais essa condição. Ao serem julgados, buscam isolamento social, aumentando o uso de telas e levando ao aumento de consumo de alimentos como forma de recompensa para sua tristeza.

Doenças endocrinológicas e síndromes genéticas

Diferente das outras causas, em algumas doenças endocrinológicas e síndromes genéticas a obesidade é uma consequência metabólica da própria doença de forma que o aumento de peso é menos dependente de hábitos e escolhas erradas de  alimentos hipercalóricos ou de sedentarismo. Mas a obesidade de causa endocrinológica é bem rara e responde por menos de 2% dos casos.

Quer conferir um pouco mais sobre as principais síndromes genéticas e doenças endocrinológicas que levam à obesidade? Então, basta conferir a rotina Obesidade – Na criança no App Blackbook!

Consequências da obesidade para a criança

Entre 40 e 80% das crianças obesas serão adultos obesos. Essa métrica demonstra a gravidade dessa epidemia, como o quão importante é identificar a obesidade infantil, entender as suas causas e propor um tratamento.

A obesidade, sobretudo a central ou abdominal, reduz muito a expectativa média de vida por estar fortemente relacionada a fatores de risco de doença cardiovascular e cerebrovascular e de alguns tipos de câncer como:

  • Dislipidemia;
  • Hipertensão arterial;
  • Resistência periférica à insulina seguida de diabetes tipo 2;
  • Aterosclerose precoce;
  • Síndrome metabólica;
  • Esteatose hepática não alcoólica.

Visando abordar e tratar essa condição o mais cedo possível, é importante entender quando suspeitar e quando confirmar.

Diagnóstico clínico da obesidade infantil

Geralmente, na primeira observação da criança ou adolescente durante a consulta clínica o problema da obesidade já é evidente. No entanto, uma vez que se trata de um tabu da sociedade, muitas vezes a obesidade não é apontada pelos pais como motivos de consulta, cabendo aos médicos tomar iniciativa de abordar o problema de forma empática e objetiva.

A abordagem clínica tratando-se de crianças pode começar com perguntas do tipo: 

  • “Você tem alguma preocupação com relação ao peso do seu filho?” 
  • “O peso tem causado algum problema para ele?” 

Em casos de adolescentes, a abordagem pode começar com perguntas do tipo:

  • “Você gostaria de discutir a questão do seu peso?”
  • “O seu peso tem te causado algum problema físico ou psicológico?

O IMC e a obesidade infantil

Mesmo que a resposta seja negativa para as perguntas mencionadas, é importante fornecer informações sobre as consequências do excesso de peso sobre a saúde à longo prazo. Além disso, se colocar à disposição para ajudar e continuar acompanhando a cada consulta a evolução peso, estatura, calculando e explicando para para o paciente o IMC para a idade, utilizando como referências como as da OMS em percentil ou desvio-padrão.

Nos adultos, a avaliação do IMC é mais simples. Resultados maiores que 25, é diagnosticado sobrepeso enquanto os acima de 30 configura o diagnóstico de obesidade. No entanto, em crianças, a análise antropométrica é um pouco mais complexa.

Para isso, são utilizadas as tabelas abaixo:

Tabela 2-  Referência de IMC de crianças de 0 a 5 anos por idade e sexo. Fonte: App BlackBook
Tabela 3- Referência de IMC de crianças maiores de 6 anos por idade e sexo. Fonte: App Blackbook

Quando olhamos essa quantidade de dados, pode parecer extremamente complexo. Porém, a interpretação é simples e deve seguir alguns passos:

  • Para crianças menores de 5 anos:
  1. Encontrar qual o valor limite para idade que dita obesidade (%till 99);
  2. Multiplicá-lo pelo quadrado de sua estatura (ou multiplicar pela estatura duas vezes)
  3. O resultado dessa multiplicação ditará o peso máximo para aquela criança com aquela idade. Pesos acima desses valores classificam a criança como obesa.

Quando o peso da criança se enquadra no %till 97, ela é classificada como sobrepeso, devendo receber orientação ainda assim para evitar uma futura obesidade.

  • Para crianças maiores de 6 anos:
  1. Encontrar qual o valor limite para idade que dita obesidade (%till 97);
  2. Multiplicá-lo pelo quadrado de sua estatura.
  3. O resultado dessa multiplicação ditará o peso máximo para aquela criança com aquela idade. Pesos acima desses valores classificam a criança como obesa.

Tratamento da obesidade infantil

A importância em realizar a prevenção e tratar a obesidade infantil está baseada nas evidências de associação com multimorbidades, a nível cardiovascular, cerebrovascular, metabólico, gastrointestinal, ortopédico e respiratório. Além disso, ainda há as limitações físicas e distúrbios psicossociais.

A prevenção e o tratamento podem ser implementadas tanto pelo médico quanto por outros profissionais de saúde (enfermeiros, nutricionistas, psicólogos, educadores físicos etc.), sempre com a participação da família e ajuda da escola e de programas do Ministério e Secretarias de Saúde e de iniciativa comunitária de combate à obesidade infantil.

Porém, como os profissionais da saúde podemos ter limitações para intervir diretamente sobre o problema na nossa rotina de trabalho e, nesse caso, é importante conhecer formas para colaborar no controle da problema individual de cada paciente e de forma coletiva na comunidade.

Como em qualquer doença de difícil controle ou cura, a melhor alternativa é a prevenção. Os profissionais da saúde precisam estar atentos e agir ao primeiro sinal de ganho exagerado de peso como medidas como:

  • Incentivando o aleitamento materno e orientando como deve ser feito e por quanto tempo;
  • Orientando sobre a introdução correta de alimentar e conceitos de alimentação saudável mesmo após o desmame;
  • Incentivar o uso de “comida de verdade” e restrição na compra ena oferta de alimentos industrializados e ultraprocessados
  • Vigilância sobre o ganho de peso e evolução do IMC;
  • Orientando sobre o controle do tempo de tela (principal fator atual de sedentarismo);
  • Incentivando a prática de atividade física diária.

E se a prevenção não for efetiva?

Em casos nos quais a prevenção não foi efetiva, é importante salientar que o primeiro passo importante do profissional médico é não ignorar o problema.

Quanto mais rápido iniciar a abordagem e mais frequentes forem os  acompanhamentos e a formação de um bom vínculo com a família e seu paciente, maiores serão as chances de sucesso. Para isso, o App da Blackbook oferece um guia de manejo da obesidade por estágios que vale muito a sua atenção.

O plano de tratamento deve estar muito bem orientado, envolvendo todos os pontos supracitados. É importante ressaltar que não basta apenas motivação da criança e adolescente.

Muitas vezes, a alimentação disponível em casa pelos pais não colabora para a manutenção do plano de tratamento. Assim, é necessária conscientização familiar a respeito da sua importância no sucesso do plano terapêutico. A imagem a seguir é muito objetiva para explicar os pontos mais importantes do tratamento:

Pontos mais importantes do tratamento da obesidade infantil.

Fonte: App Blackbook

Adaptando-se à realidade

É recomendável encaminhar o paciente, acompanhado por seus pais, para um profissional de nutrição visando garantir que o plano alimentar. Consequentemente, deve-se planejar a ingestão calórica da forma mais personalizada possível para cada paciente.

O tratamento da obesidade infantil é complexo, assim como a sua prevenção. Por isso, vale estar sempre atualizado sobre o que há de mais atual – e isso o app da Blackbook garante!

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REFERÊNCIAS:

CAPISTRANO, Gisele Bailich et al. Obesidade infantil e suas consequências: uma revisão da literatura. Conjecturas, v. 22, n. 2, p. 47-58, 2022.

DA SILVA, Chrisllayne Oliveira et al. Intervenções não farmacológicas no manejo da obesidade infantil: uma overview. Arquivos de Ciências da Saúde da UNIPAR, v. 27, n. 4, p. 1672-1703, 2023.

Penedo MM, Pinto PM, Beja GBSP, Oliveira GALL, Gonçalves MH, Anderi S. A importância do aleitamento materno exclusivo na prevenção da obesidade infantil: uma revisão integrativa.
Rev de Saúde 2023;14(1):33-40.

Pezzuti IL, Oliveira RG. Obesidade infantil. In: Blackbook Pediatria. 5a. Ed. B.Horizonte. Blackbook Editora, 2023.