Mulher com dor abdominal intensa, um dos sintomas da colecistite aguda.
ATENÇÃO: O conteúdo a seguir sobre colecistite aguda foi desenvolvido para profissionais e estudantes da área da saúde. Não deve ser utilizado como fonte de consultas por pessoas leigas.

A colecistite aguda é uma emergência gastrointestinal comum, afetando 20% dos casos de litíase biliar. Entre os sintomas estão a dor abdominal intensa, febre, náuseas e vômitos. Saiba mais sobre o tema!

A vesícula biliar é um importante órgão para a fisiologia do sistema digestivo. Localizada abaixo do lobo direito do fígado, tem como principais funções armazenar e secretar a bile em momentos de alimentação rica em gorduras – uma vez que a bile atua junto às lipases intestinais na digestão desses alimentos emulsificando-os. Apesar da importância desse órgão, ele está relacionado a alguns dos mais prevalentes problemas do trato gastrointestinal observados na clínica.

A colelitíase, por exemplo, acomete um quarto das mulheres e 12% dos homens após os 50 anos, condição na qual os cálculos (formados em 75% dos casos de colesterol) estão presentes na vesícula biliar ou na via biliar.

A estase biliar, como consequência da presença de cálculos na vesícula biliar, é um dos principais fatores que levam ao tema analisado a seguir: a coleciste aguda.

O que é colecistite aguda?

A colecistite aguda é um dos principais diagnósticos gastrointestinais realizados nos atendimentos emergenciais. Dos casos de litíase biliar, sintomáticos ou não, 20% desenvolvem um quadro de colecistite ao longo da vida. Ela costuma ser mais prevalente em pessoas que possuem fatores de risco como:

  • Obesidade;
  • Exposição hormonal;
  • Diabetes mellitus;
  • Doença hepática;
  • Idade superior a 40 anos;
  • Perda de peso drástica.

A patologia ocorre devido ao esvaziamento inadequado da vesícula biliar, seja por oclusão do ducto cístico, seja pelo mau funcionamento mecânico da vesícula. Isso gera estase da bile, edema da parede da vesícula, isquemia e gangrena. Aproximadamente 90% dos casos estão relacionados à colelitíase, com obstrução do colo vesical ou do ducto biliar comum. Enquanto isso, 10% relacionam-se a alterações isquêmicas da parede da vesícula.

Colecistite aguda litiásica x colecistite aguda alitiásica

A colecistite aguda litiásica é a forma mais comum, ocorrendo em 90% dos casos, como pontuado. Diante de um cálculo no ducto cístico, este acaba impossibilitando a drenagem da bile, gerando estase, distensão da parede da vesícula, isquemia e necrose. Os cálculos se dividem em dois tipos: de colesterol e de pigmento – sendo os de colesterol mais prevalentes (75% dos casos).

Cálculos de colesterol se formam a partir da hipersecreção de colesterol na vesícula, resultando em saturação biliar, nucleação e crescimento do cálculo. Os cálculos pigmentares podem ser pretos ou marrons. Em pacientes que apresentam hemólise crônica, os pretos são mais comuns. Já os marrons podem ser encontrados em pacientes que apresentam infecção dos ductos biliares obstruídos.

A colecistite aguda alitiásica corresponde à forma menos comum dessa patologia, presente em 10% dos casos. Ela tem esse nome, pois não está relacionada com a presença de um cálculo no ducto cístico, mas sim com a inflamação do ducto e consequente impedimento da passagem da bile. Esse tipo de colecistite geralmente está presente em pacientes graves, geralmente em leitos de UTI.

É possível notar que em ambas as formas da patologia aguda, a inflamação está presente, ora como agente do problema, ora como resultado. No entanto, é importante pontuar que geralmente, ela é estéril, podendo haver em seguida crescimento de bactérias entéricas, como E. coli, Klebsiella e Enterococcus.

Colecistite aguda x colecistite crônica

Como em qualquer outra manifestação aguda, na colecistite aguda os sintomas surgem de repente, causando dores intensas e constantes com possibilidade de irradiar por todo o abdômen superior. Tanto na forma litiásica quanto na alitiásica, a interrupção do fluxo da bile gera inflamação que leva à dor intensa relatada pela maioria dos pacientes que desenvolvem a forma aguda da doença.

Na colecistite crônica, a inflamação da vesícula biliar é mais prolongada. O tempo de inflamação prolongado leva a algumas das manifestações clínicas mais prevalentes dessa forma da patologia: cólica biliar, ou seja, crises repetidas de dor quando ocorre o bloqueio temporário do ducto cístico.

Cabe pontuar que a cronificação advém da permanência de cálculos biliares nas vias biliares e de outros episódios agudos da doença.

Mulher com dor abdominal intensa, um dos sintomas da colecistite aguda.
Imagem: Entre os sintomas comuns à colecistite aguda, a dor abdominal é o principal indicativo.

Quais são as manifestações clínicas da colecistite aguda?

Na colecistite aguda, a dor abdominal é o sintoma dominante e que mais chama a atenção, sendo o principal motivo de busca por atendimento médico em menos de uma semana após o início da doença. 

Características da dor abdominal:

  • Dor aguda;
  • Localizada no quadrante superior direito, principalmente no hipocôndrio direito, podendo irradiar para as regiões escapular, dorsal ou epigástrica;
  • Aumento progressivo da dor, diferenciando-se da cólica biliar presente na forma crônica da doença;
  • Geralmente é desencadeada pela alimentação.

Associado à dor abdominal, em 70% dos pacientes estão presentes outros sinais e sintomas, como febre, náuseas e vômitos. Inclusive, estes são explicados pelo processo inflamatório em si e até mesmo pelo quadro de dor intensa.

O quadro de febre varia entre 37° e 39° C. Ademais, quando os valores estão acima de 38° C, junto de calafrios, leucocitose e diminuição da peristalse, podem sugerir a formação de abscesso ou mesmo perfuração da vesícula biliar.

A tríade clássica de Charcot (dor no hipocôndrio direito + febre com calafrios + icterícia) não é muito comum. Uma vez que na colecistite aguda a icterícia se manifesta em apenas 10% dos casos, ela se mantém mais relacionada à colangite e à obstrução do colédoco. Apesar de não ser comum, deve ser tratada como sinal de alerta devido à sua ligação com infecções da via biliar que podem necessitar de tratamento.

Importante ressaltar!

Durante o exame físico, serão observadas sensibilidade e rigidez abdominal significativas à palpação, podendo haver a presença de massa abdominal devido ao aumento da vesícula biliar ou à aderência do peritônio e órgãos à vesícula. Além disso, um indício típico da colecistite aguda é o sinal de Murphy positivo, que ocorre na palpação profunda do hipocôndrio direito. 

No app Blackbook, os sinais e sintomas ainda mais específicos, além do passo a passo da realização de todos os exames físicos, estão bem detalhados. Vale a pena conferir!

Como confirmar o diagnóstico da patologia?

O diagnóstico da colecistite aguda envolve, além dos critérios clínicos, a utilização de exames de imagem. Conforme a Diretriz de Tóquio de 2018, o diagnóstico definitivo da doença é estabelecido pela presença de achados de imagem que estejam associados a sinais locais e sistêmicos de inflamação.

Sendo assim, vale a pena entender um pouco sobre os principais exames de imagem utilizados, não é mesmo?

Ultrassonografia abdominal

Utilizada para confirmar imediatamente ou afastar suspeita de colelitíase e colecistite. Nesse exame, os cálculos biliares poderão estar na vesícula ou nas vias biliares. A sensibilidade dessa forma diagnóstica para colecistite é de 88% e a especificidade é de 80%. 

O achado de “bile espessa” ao ultrassom deve ser visto como uma possível causa de colecistite aguda. Este achado está associado a desidratação da bile que permaneceu um longo tempo na vesícula (jejum prolongado ou nutrição parenteral prolongado). No entanto, pode ocorrer também em pacientes diabéticos e com anemias hemolíticas.

Na colecistite aguda alitiásica, a vesícula apresenta-se dilatada, com paredes espessadas, com a bile turva, podendo conter sedimentos.


Tomografia computadorizada

É solicitada apenas quando não é possível fechar o diagnóstico com precisão. Por meio desse exame de imagem, é possível visualizar achados de líquido pericólico e espessamento da parede da vesícula biliar nos casos de colecistite aguda. Além disso, trata-se do mais efetivo quando há suspeita de câncer de vesícula biliar.

Ressonância nuclear magnética

Identifica achados semelhantes aos encontrados na ultrassonografia e na tomografia computadorizada. 

Vimos 3 dos vários exames de imagem existentes e detalhados no app Blackbook. No entanto, exames de imagem, quando corretamente solicitados, são de extrema importância para a confirmação da colecistite aguda. Afinal, a ausência de diagnóstico pode levar ao aumento da morbidade e mortalidade dos pacientes.

Por esse motivo, é importante estar por dentro não só desses, como também de todos os outros métodos diagnósticos de imagem.

Vale ressaltar que há chances de alterações nos exames laboratoriais como o hepatograma, com elevação das transaminases, da fosfatase alcalina, bilirrubinas e amilase. Ademais, a hiperamilasemia pode ocorrer devido à obstrução do ducto pancreático levando à pancreatite concomitante.

Quais as abordagens do tratamento da colecistite aguda?

O tratamento da colecistite aguda envolve abordagens conservadoras e/ou cirúrgicas, dependendo do paciente em questão bem como da gravidade do quadro. Sendo assim, vamos dividir as abordagens em três etapas.

Suporte clínico

A primeira etapa do tratamento da colecistite aguda está relacionada a várias medidas gerais, como o controle da dor. Pacientes com dor aguda devem ser medicados preferencialmente por via endovenosa, para analgesia e controle de náuseas e vômitos. Por isso, também recomenda-se jejum e hidratação endovenosa até o descarte da possibilidade cirúrgica.

Outras ações dessa etapa são:

  • Garantir manutenção da volemia por meio da hidratação endovenosa;
  • Monitorar bem como corrigir possíveis alterações eletrolíticas;
  • Administração de antitérmicos, antieméticos e inibidores de bomba de prótons para pacientes com respectivas sintomatologias.

Administração de antibióticos intravenosos

Como segunda etapa do tratamento da colecistite aguda deve ser feito o tratamento empírico, que é o mesmo do tratamento das infecções intra-abdominais em geral. As principais alternativas terapêuticas se dividem em dois grupos:

  • Casos comunitários leves ou moderados e de baixo risco.

Exemplo: monoterapia endovenosa com piperacilina-tazobactam.

  • Casos comunitários graves ou de alto risco

Exemplo: monoterapia endovenosa com imipeném-cilastatina.

Normalmente, a duração do tratamento com antibióticos é adaptada conforme a situação clínica. Para pacientes que passaram por colecistectomia devido à colecistite não complicada, por exemplo, há a interrupção dos antibióticos no dia seguinte à cirurgia.

Tratamento cirúrgico

A colecistite aguda, como vimos até aqui, está relacionada em 90% das vezes com a litíase biliar. Sendo assim, mesmo com a solução de um quadro agudo sem intervenção cirúrgica, a probabilidade de o paciente voltar a ter manifestações agudas subsequentes faz da colecistectomia a terapia definitiva.

É importante realizar a colecistectomia laparoscópica no período ótimo de 72 horas, mas a maioria dos serviços cirúrgicos indicam segurança de operação até 7 dias do início dos sintomas. Em situações nas quais não ocorra melhora com tratamento conservador, mesmo após 7 dias, a cirurgia acontece ainda assim, caso paciente evolua com colecistite complicada, ruptura de vesícula ou abscesso.

Outro fato importante é que pacientes instáveis ou com comorbidades graves podem ser operados tardiamente, cerca de 6 semanas após a resolução do processo inflamatório. 

É fato que a quantidade de informações que precisamos saber a respeito de colecistite aguda não é pequena. Por isso, trouxemos as informações mais pertinentes e confiáveis a respeito dessa patologia. No entanto, muitas outras informações, ainda mais detalhadas, completas e atualizadas do ponto de vista clínico e cirúrgico estão presentes no app Blackbook.

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Referências

DE VASCONCELLOS, Luisa Almeida Sarti et al. Colecistite Aguda: aspectos clínicos e manejo terapêutico: Acute Cholecystitis: clinical aspects and therapeutic management. Brazilian Journal of Development, v. 8, n. 10, p. 68667-68678, 2022.

Gallaher JR et al. Acute Cholecystitis – A Review. JAMA 327:965-975, 2022.

MeloI. C.; AmaralA. C. T. L.; SalomãoB. B.; FariaJ. M. de M.; SampaioM. V.; MenezesM. C. S.; BezerraP. M. V.; StehlingT. V.; RochaV. L. S.; JulianiA. A incidência de Colecistite Aguda em pacientes com Diabetes Mellitus tipo 2. Revista Eletrônica Acervo Médico, v. 23, n. 1, p. e11928, 1 fev. 2023.

Rotina: Colelitíase e colecistite NO ADULTO. Blackbook, versão digital. 2023.