Rebaixamento do nível de consciência: o que fazer após aplicar a Escala de Glasgow?

ATENÇÃO: O conteúdo a seguir sobre rebaixamento do nível de consciência e Escala de Coma de Glasgow foi desenvolvido para profissionais e estudantes da área da saúde e não deve ser utilizado como fonte de consultas por pessoas leigas. Uma das situações mais críticas no plantão é se deparar com um com rebaixamento do nível de consciência. A Escala de Coma de Glasgow é essencial para avaliar a gravidade do quadro, mas é apenas um dos passos. Depois de pontuar o paciente, como conduzir a investigação? Quais exames pedir? Quando intubar? Como diferenciar causas neurológicas das metabólicas? Este artigo responde algumas perguntas sobre a avaliação e o manejo de pacientes críticos com base em protocolos internacionais e diretrizes atualizadas — tudo com aplicação prática imediata. 👉 Se você ainda não domina a Escala de Glasgow, leia primeiro este outro artigo: O guia para compreender a Escala de Coma de Glasgow Começando pelo básico: ABCDE Todo paciente com rebaixamento do nível de consciência deve ser inicialmente avaliado com o protocolo ABCDE das prioridades iniciais: Outras condutas emergenciais no paciente com rebaixamento do nível de consciência Avaliar caso a caso, a necessidade de: A hipoglicemia é uma causa comum e reversível de rebaixamento do nível de consciência e, por isso, a reposição de glicose deve ser iniciada imediatamente se os exames detectarem necessidade, ou mesmo preventivamente, caso não seja possível medir a glicemia. Em pacientes com risco nutricional, recomenda-se administrar tiamina IV antes ou junto com a glicose para prevenir ou tratar encefalopatia de Wernicke. 💡Na suspeita de uso excessivo de opioides, administrar naloxona – a melhora rápida confirma o diagnóstico. Quando indicar intubação? A intubação orotraqueal geralmente está indicada em pacientes com Glasgow ≤ 8, especialmente em pacientes com lesão cerebral traumática. No entanto, outras situações também podem influenciar na decisão de intubar: Pacientes com Glasgow entre 9 e 12 requerem monitoramento intensivo, reavaliação frequente e atenção especial ao padrão respiratório e alteração pupilares. Sinais de herniação cerebral iminente incluem: Caso algum desses sinais seja identificado, é importante investigar e tratar o mais rápido possível para evitar danos irreversíveis. Manejo inicial da pressão intracraniana (PIC): O diagnóstico de elevação da pressão intracraniana (PIC) envolve sinais e sintomas clínicos e, quando possível, resultados de exames de imagem. A monitorização da PIC é realizada por procedimento invasivo e está associada a riscos para o paciente, por isso é recomendada apenas nos casos em que a suspeita é evidente. Os procedimentos para evitar ou reduzir a PIC envolvem: Em pacientes já intubados, considerar o uso da escala de coma FOUR score (Full Outline of UnResponsiveness, ou “esboço completo da falta de resposta”), que avalia reflexos do tronco e padrão respiratório — pontos não cobertos pela escala de Glasgow. Interpretação da escala de FOUR 16 pontos: estado de consciência normal.0 pontos: suspeita de morte cerebral.Quanto menor a pontuação, pior é o estado mental do paciente. Exames que não podem faltar Após avaliação com o ABCDE e estabilização do paciente, dar sequência com a investigação etiológica. No entanto, em alguns casos essa investigação depende da avaliação inicial do quadro e do relato de parentes e testemunhas que possam oferecer informações sobre o acontecimento e sobre o paciente. Os exames iniciais incluem: Em pacientes com quadro abrupto, pensar em AVC de tronco, especialmente se Glasgow < 9 e TC inicial normal. Além disso, nesses casos, solicitar angiotomografia cerebral. Conduta inicial no paciente com rebaixamento do nível de consciência Muitos casos de coma e rebaixamento do nível de consciência são causados por distúrbios metabólicos ou tóxicos, enquanto outros são estruturais, como AVC, TCE ou tumores. Esta tabela ajuda a orientar o raciocínio clínico: Características Causa estrutural Causa metabólica/tóxica Início Súbito Gradual Exame neurológico Sinais focais (ex: hemiparesia) Achados simétricos Pupilas Assimétricas ou não reativas Normais ou simétricas Respiração Padrões anormais localizatórios Hiperventilação ou respiração lenta TC de crânio inicial Geralmente alterada Pode ser normal Exemplos Hematoma, tumor, AVC extenso Cetoacidose, uremia, hiponatremia, encefalopatia hepática, álcool, sedativos/opioides Diferenças entre causas estruturais e metabólicas do coma. Diagnósticos diferenciais importantes Além das causas já citadas, é essencial pensar em outras condições que mimetizam coma: Além disso, alterações pupilares (anisocoria, midríase, miose) e padrão respiratório ajudam a localizar lesões em tronco cerebral. Reflexos do tronco cerebral — como o corneano, oculocefálico e oculovestibular — também devem ser avaliados. A ausência desses reflexos pode indicar lesão grave. Condutas específicas em casos críticos com rebaixamento do nível de consciência: Populações específicas: Conclusão O rebaixamento do nível de consciência exige uma abordagem rápida, estruturada e sistemática, e, por isso, a conduta deve ser imediata. A aplicação da Escala de Coma de Glasgow é apenas um dos passos iniciais desse processo, que demanda desenvoltura e experiência. Além disso, a correta identificação da causa — estrutural, tóxica, metabólica ou infecciosa — depende de um exame físico direcionado e de exames complementares bem escolhidos. Com ferramentas confiáveis à mão, como as calculadoras clínicas do app Blackbook, é possível tomar decisões mais seguras mesmo nos casos mais críticos. 📲 Quer aplicar rapidamente as calculadoras Glasgow, SOFA, NEWS ou NIHSS? Todas estão disponíveis no app Blackbook gratuitamente. Cadastre-se e comece a utilizar agora! Referências Rajajee V. Management of acute moderate and severe traumatic brain injury. UpToDate. 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O guia para compreender a Escala de Coma de Glasgow


ATENÇÃO: O conteúdo a seguir sobre escala de coma de Glasgow foi desenvolvido para profissionais e estudantes da área da saúde e não deve ser utilizado como fonte de consultas por pessoas leigas. A Escala de Coma de Glasgow, criada há mais de 40 anos, visa avaliar o grau de comprometimento neurológico de um paciente se baseando em três aspectos: abertura ocular, resposta verbal e motora. Conhecê-la é de suma importância, vamos lá? A Escala de Coma de Glasgow apareceu em publicações pela primeira vez na revista Lancet em 1974 por Graham Teasdale e Bryan J. Jennett, ambos do Instituto de Ciências Neurológicas de Glasgow, na Escócia. Ao contrário do que geralmente acontece, ela recebeu o nome do local de criação e não de quem a criou. Independente dessa curiosidade, é até hoje amplamente utilizada no Brasil e no mundo. Inicialmente, era mais usada para avaliar pacientes vítimas de traumatismo craniano, tendo como enfoque seu grau de consciência. Hoje, ainda se vale nesses casos, mas também se aplica em qualquer doença aguda ou crônica com alteração do estado de consciência e na monitorização de pacientes em unidades de cuidado intensivo. O que é a Escala de Coma de Glasgow? Aplicada como ferramenta de avaliar o nível de consciência de pacientes, baseia-se na avaliação de um sistema de pontuação de três critérios: Diante disso, há a soma das pontuações constatadas em cada critério com variação de 3 a 15 pontos, no qual o paciente consciente e orientado tem Glasgow de 15. A pontuação final será maior ou menor conforme a gravidade da situação que o paciente está vivendo. Esse intervalo de variação é referente à Escala de Glasgow convencional, não incluindo, ainda, a atividade pupilar do paciente, critério que será apresentado a seguir. Agora que já sabemos do que se trata a Escala de Glasgow e qual a sua finalidade, vamos entender um pouco sobre os critérios clínicos utilizados. Critérios clínicos da Escala de Coma de Glasgow É importante avaliar Glasgow ao atender pacientes que sofreram ou podem ter sofrido um trauma, com suspeita de acidente vascular encefálico, com risco de parada cardiorrespiratória, com rebaixamento do nível de consciência no geral ou até mesmo situações de monitorização. Abertura ocular Nesse critério, a pontuação poderá variar de 1 a 4 pontos, sendo o paciente avaliado e pontuado conforme os comportamentos apresentados a seguir: Resposta verbal Nesse critério, a pontuação poderá variar de 1 a 5 pontos, sendo o paciente avaliado e pontuado conforme os comportamentos apresentados a seguir: Resposta motora Nesse critério, a pontuação poderá variar de 1 a 6 pontos, sendo o paciente avaliado e pontuado conforme os comportamentos apresentados a seguir: Resposta pupilar Agora que vimos os critérios clínicos da Escala de Coma de Glasgow convencional, vale ressaltar que a avaliação passou a incluir a resposta pupilar a partir de 2018. Seu uso acontece da seguinte forma: Outro aspecto importante é que em crianças menores de quatro anos, a avaliação da resposta verbal não se faz da mesma forma, podendo sofrer alterações dos critérios de avaliação. Para ficar por dentro disso, confira a rotina “Traumatismo craniano – na criança” disponível no app da Blackbook. Na prática “Um paciente adulto, vítima de atropelamento, apresenta abertura ocular após pressão no leito ungueal, resposta verbal confusa, flexão anormal do membro superior e reatividade pupilar bilateral”. De acordo com a Escala de Coma de Glasgow, qual a pontuação final e qual o grau de lesão neurológica atribuídos ao paciente? Analisando os critérios já apresentados temos: Sendo assim, pontuação final é de 9 pontos, equivalente a um grau de lesão moderado. Com objetivo de analisar o grau de lesão neurológica, ainda há uma segunda resposta esperada. Então, vamos conferir um pouco sobre interpretação dos resultados da Escala de Coma de Glasgow? Como interpretar os resultados da Escala de Glasgow? Na prática, a avaliação do Escore Glasgow é apenas um componente do exame neurológico. Além disso, é crucial avaliar a reatividade das pupilas (desde 2018), o fundo do olho, os reflexos do tronco cerebral, os reflexos dos membros, os sinais de meningite e a resposta plantar. Em conjunto, os resultados do exame podem auxiliar na identificação da localização de uma lesão neurológica. No entanto, usa-se a somatória das pontuações obtidas em cada critério apresentado anteriormente como referência do quadro neurológico, profundidade do coma, risco de apneia e parada: Caso a pontuação total do paciente seja menor ou igual a 8, a indicação é que esse paciente vá para intubação orotraqueal, visando garantir acesso às vias respiratórias e consequente manutenção da respiração, mesmo que mecânica, caso paciente rebaixe ainda mais. Ou seja, a Escala de Glasgow, quando aplicada corretamente, é muito efetiva e bem-vinda, no entanto, acaba tendo algumas limitações. Quais são as limitações? Quem faz a avaliação de cada paciente por meio da pontuação são pessoas, passíveis de erros, podendo avaliar diferentemente de outro profissional, um mesmo paciente, principalmente se não estiver bem treinado. Por isso, é muito importante praticar. O estudo e treino são essenciais – seja por meio da leitura de materiais como estes ou de casos clínicos, seja na prática. Quando não usar a Escala de Glasgow? Outro ponto importante, é que o uso dessa técnica só poderá acontecer caso os três critérios de avaliação sejam concluídos. Isso significa que em casos como: Sendo assim, caso não seja possível pontuar um dos critérios já apresentados, não se indica o uso da Escala de Coma de Glasgow. Alguns outros fatores apontados por pesquisadores como limitações são: Nas últimas quatro décadas, a Escala de Coma de Glasgow emergiu como a ferramenta principal empregada em mais de 80 países para avaliar o nível de consciência em pacientes. Se aplicada de maneira adequada e com pleno conhecimento de suas limitações, ela se revela um auxílio inestimável na avaliação clínica. Agora que já conhece as aplicações da Escala de Glasgow, bem como suas limitações, aprofunde seus conhecimentos com as rotinas do app da Blackbook. Aproveite e teste 7 dias grátis todo o conteúdo! Referências BANDYOPADHYAY, Soham et al.